Falta de estrutura dificulta o combate à violência contra a mulher


Pelo menos quatro mil mulheres morrem por ano no País  vítimas dos próprios companheiros
Ir a uma delegacia, enfrentar o constrangimento e a vergonha são as primeiras barreiras enfrentadas pelas mulheres vítimas de violência. Após este passo, enveredar por uma estrutura de atenção estatal que enfrenta dificuldades para funcionar em rede também alimenta outro receio: a impunidade. “Há casos em que se passam até quatro meses para que o agressor seja ouvido na delegacia”, conta o pedagogo Mário Sérgio Leonor, do Centro de Referência Loreta Valadares (no bairro da Federação).
A hoje militante Maria Iracema Souza Santos, 46, sofreu por quatro anos os maus-tratos do marido, já falecido. O companheiro tentou matá-la para ficar com herança e provocou um acidente que lhe deixou numa cadeira de rodas. Após realizar nove cirurgias para curar-se do acidente, sobre o qual ela rejeita comentar, Maria Iracema se viu em condições de procurar ajuda e foi ao Loreta Valadares  em agosto de 2006. Ela fundou a ONG Feliz Cidade, em Fazenda Coutos, onde tenta conscientizar as mulheres sobre a necessidade de denunciar os maus-tratos.
Mas ela já enfrentou revezes. “Uma vizinha minha teve o pescoço cortado. Tentamos recorrer à Justiça para que ela tivesse proteção, mas não deu tempo”, conta Maria Iracema, que salienta a morosidade dos órgãos executivos e judiciários para proteger as vítimas de violência. “As pessoas estão sobrecarregadas”, avaliou.
Segundo a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI)  sobre a Violência contra a Mulher no Brasil, do Congresso Nacional, pelo menos quatro mil mulheres morrem por ano no País  vítimas dos próprios companheiros. Hoje, tramitam na Justiça baiana cerca de 15 mil processos nas duas varas especializadas de combate à violência contra a mulher, em Salvador (70%) e em Feira de Santana (30%). Os números estão abaixo dos da Justiça de Minas Gerais. Lá são 58 mil processos em andamento espalhados nas 295 comarcas.
Na Bahia, o número de delegacias especializadas é insuficiente. São 15 para uma população de 13,6 milhões de habitantes residentes em 417 municípios (duas delas em Salvador),  quando o ideal é haver uma delegacia especializada para cada grupo de 50 mil habitantes. Por uma conta simples, chega-se ao que seria o número ideal: 272 unidades para cobrir todo o Estado. “Municípios como Lauro de Freitas, por exemplo, que têm mais de 100 mil habitantes, deveriam ter duas delegacias, mas não têm nenhuma”, apontou Maria Helena Souza, membro da Regional Bahia da Rede Feminista de Saúde.
Medo de falar - No Centro de Referência Loreta Valadares, a equipe de reportagem do A TARDE encontrou duas mulheres que faziam o primeiro contato com a instituição. O medo ainda é evidente nestas horas, e falar das agressões  é um dos momentos mais difíceis, segundo os profissionais do Loreta Valadares.
O pedagogo Mário Sérgio Leonor faz uma rápida descrição de como são estas mulheres. “Geralmente possuem baixo nível de instrução, são negras, têm de 25 a 40 anos e dependem do marido economicamente”, enumera Mário Sérgio, que acompanha os filhos das mulheres violentadas.
“A criança também sofre ao acompanhar, dia após dia, a mãe ser agredida. Isso se reflete no desempenho escolar. Ela fica ou muito violenta ou muito apática, não quer estudar”, aponta o pedagogo, que ressalta que os profissionais dos centros de referência fazem também contato com as escolas em que estudam as crianças.
Ser um homem o responsável pelo atendimento às crianças tem um motivo também no Loreta Valadares: criar uma imagem de homem acolhedor, não somente espancador. O centro também realiza formações em bairros da capital baiana: no dia 24, será na região de Itapagipe, depois Valéria, dia 26, e Cajazeiras X, dia 2 de agosto.
Atardeonline

Postar um comentário

0 Comentários
* Please Don't Spam Here. All the Comments are Reviewed by Admin.